Uma megaoperação da Polícia Federal desmontou uma quadrilha formada por empresários e servidores públicos que atuavam em todo país. Eles usavam emendas parlamentares para fraudar licitações e superfaturar obras públicas.
Asfalto grudento, derretido, e que desmancha na mão. As obras em Campo Formoso, cidade que fica a 500 km de Salvador (BA), custaram R$ 45 milhões para os cofres públicos e foi entregue em péssimo estado.
Na comunidade quilombola de Laje dos Negros, onde a obra começou, o dinheiro investido parece ter derretido junto com a pista. Em Lagoa Porco, onde o trecho termina, o resultado é o mesmo.
Segundo a Polícia Federal, essa é apenas uma de várias obras públicas superfaturadas por uma quadrilha que agia em todo país. A organização criminosa ajustava editais, eliminava concorrentes e negociava pagamentos de propina.
O dinheiro da corrupção era transportado em jatinhos entre os municípios onde eram feitos os contratos e Brasília. Em Campo Formoso, só nos últimos dois anos, o esquema recebeu quase R$ 50 milhões em recursos públicos.
“O que a gente não consegue, nesse momento afirmar, é a participação de políticos na atuação criminosa, até porque a destinação das emendas é uma conduta lícita e prevista na legislação do Brasil”, explica o delegado Tiago dos Santos Souza.
Imagens exclusivas obtidas pelo Fantástico mostram que dias antes da prisão da quadrilha, agentes da polícia federal monitoraram o embarque de dois homens no aeroporto de Salvador. O empresário Alex Rezende Parente é apontado como um dos chefes da quadrilha.
Ele é sócio da Allpha Pavimentações e Serviços de Construção Limitada, responsável pelo asfalto de Campo Formoso. Quem o acompanha é o ex-coordenador na Bahia do Departamento Nacional De Obras Contra a Seca (DNOCS).
Segundo a polícia, Lucas Maciel Lobão Vieira facilitava a aprovação de contratos do esquema. Quando o jatinho pousou em Brasília, os dois foram surpreendidos pelos agentes. Na mochila, Alex levava R$ 35 mil em espécie e alegou que era para gastos pessoais na cidade.
Em outra mala, Alex escondia R$ 1,5 milhão. O empresário chegou a dizer que o valor seria usado para comprar máquinas agrícolas, mas não apresentou provas.
Durante as buscas no avião, os policiais ainda encontraram mais de 500 documentos, uma planilha mostra que o grupo atuava em pelo menos 14 estados, e que acumulava mais de R$ 820 milhões em contratos.
Um áudio mostra a preocupação de Geraldo Guedes de Santana Filho e Iuri dos Santos Bezerra, que trabalhavam para Alex, e acabaram presos dias depois.
Segundo a polícia, o empresário José Marcos de Moura, atua em Brasília articulando a liberação de dinheiro que financia obras superfaturadas em vários estados, fraudando licitações e ainda pagando milhões de reais em propina.
Além das aeronaves, foram aprendidos 23 carros de luxo, 3 iates, 6 imóveis, jóias e mais de R$ 3 milhões em espécie.
Ao todo, 17 empresários, servidores públicos e vereadores são acusados de participar da organização criminosa que movimentou pelo menos R$ 1 bilhão. Itallo Moreira de Almeida, funcionário do governo de Tocantins, está foragido. Todos os outros foram presos.
Um deles é o ex-secretário de governo do município baiano de Campo Formoso e vereador eleito, Francisco Nascimento, do União Brasil. Quando os policiais chegaram na casa, ele jogou pela janela uma bolsa com mais de R$ 200 mil em dinheiro.
O ex-secretário de parcerias público privadas de Tocantins, Claudinei Quaresemin, também foi preso acusado de receber propina. Em uma planilha, havia informações sobre o pagamento em mais de R$ 2,5 milhões para uma única pessoa.
Em nota ao g1, a Secretaria de Estado da Educação (Seduc) esclareceu que o servidor Ítallo Moreira de Almeida não integra mais o quadro funcional da pasta desde 19 de setembro de 2024.
Como funcionava o esquema
O esquema funcionava a partir das emendas parlamentares, que usam recursos do orçamento da união. Deputados federais e senadores destinam verbas a estados, municípios e autarquias através dessas emendas.
No caso da estrada da Bahia, emendas do deputado Elmar Nascimento (do União Brasil) repassaram milhões de reais para a prefeitura de Campo Formoso, na Bahia, onde o prefeito, Elmo Nascimento, é irmão do deputado.
A prefeitura usou o dinheiro para fazer duas licitações que foram manipuladas pela quadrilha. Segundo a investigação, funcionários públicos receberam propina para passar informações privilegiadas e ajudar a eliminar concorrentes da Allpha Pavimentações LTDA.
Parte do dinheiro que a Allpha recebeu da prefeitura foi desviada para outra empresa do grupo, e depois para uma empresa fantasma, que fez pagamentos para a conta de pessoas indicadas pelos servidores que receberam propina.
Mas a empresa fantasma transferiu a maior parte dos valores que recebeu para peixarias e supermercados, que foram usados para lavar o dinheiro.
Os valores eram colocados em malas e caixas, e levados de avião também para pagar propina. A investigação concluiu que alguém vai a Brasília, consegue essas emendas por ter acesso, e depois repassam para o município. A partir daí é fraudado a licitação e o serviço é superfaturado.
Vejam a lista dos presos na operação
Alex Rezende Parente
Clebson Cruz de Oliveira
Evandro Balbino do Nascimento
Fabio Rezende Parente
Flavio Henrique de Lacerda Pimenta
Francisco Manoel do Nascimento Neto
Geraldo Guedes de Santana Filho
Iuri dos Santos Bezerra
José Marcos de Moura
Lucas Maciel Lobão Vieira