O presidente da Conafer, Carlos Roberto Ferreira Lopes, foi preso em flagrante na madrugada desta terça-feira (30/09), enquanto prestava depoimento à CPMI do INSS. Ele negou envolvimento em fraudes nos descontos de aposentados, mas afirmou desconhecer detalhes de operações de pessoas e empresas ligadas à entidade, investigadas por irregularidades.
Segundo o presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), Lopes mentiu ao colegiado, mesmo após ter se comprometido a falar a verdade. Segundo Viana, o presidente da Conafer ocultou informações e tentou convencer o colegiado de que a operação era regular.
Ao agir dessa forma, Lopes teria cometido crime de falsidade ideológica. O pedido de prisão havia sido feito pelo deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS), alegando que Carlos Roberto Ferreira praticou o crime de falso testemunho pelo menos quatro vezes ao longo da oitiva. Já o relator informou que pediria a prisão preventiva dele já nesta terça-feira.
Sei que nossa voz de prisão se repetirá, a pessoa será ouvida e liberada, mas há um grito na garganta de todos os brasileiros em relação a essa impunidade. O senhor está preso em nome dos aposentados, viúvas e órfãos do Brasil e aqui quem mente paga o preço — afirmou Viana.
Diante de um depoente nervoso, suando, com as duas mãos manchadas de uma tinta escura e ao lado de seu advogado, o presidente da Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), Carlos Roberto Ferreira Lopes se complicou na 12ª Reunião da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS de 2025, na tarde desta segunda-feira (29). Ao fim das inquirições, o relator, deputado Alfredo Gaspar (UNIÃO-AL) foi conclusivo: “A Conafer é uma organização criminosa”, acusou.
Após uma introdução em que defendeu a Conafer como uma entidade de impacto social e econômico, que diz representar 77% da mão de obra rural e com 8 milhões de associados, Lopes pediu a exibição de um vídeo institucional e solicitou a distribuição de um relatório aos parlamentares. Ele também questionou o “lockdown jurídico e financeiro” imposto à Conafer, que, segundo ele, bloqueou 100% das atividades e afetou 1.2 mil funcionários e 2.950 municípios.
O interrogatório do relator Alfredo Gaspar começou incisivo, focando na atuação da Conafer junto ao INSS. Gaspar questionou a discrepância entre a declaração inicial de Lopes de que a Conafer existe desde 2004 e sua posterior retificação para 2011 como pessoa jurídica.
Em relação aos associados, Lopes afirmou que, embora tivesse milhares de associados inativos em 2017, nenhum estava em desconto na época. Em 2025, a Conafer detinha 620 mil associados inativos com descontos.
Um dos pontos mais controversos levantados pelo relator foi o volume de recursos movimentados. Segundo a Controladoria-Geral da União (CGU), a Conafer teria apurado mais de R$ 800 milhões em descontos associativos nos últimos cinco anos, valor contestado por Lopes, que estimou entre R$ 500 milhões e R$ 600 milhões.
Nepotismo: O presidente da Conafer, Carlos Roberto confirmou que seu irmão, Tiago Abraão Ferreira Lopes, é Vice-Presidente, Tesoureiro e Secretário-Geral da Conafer. Outro irmão, Alexandre Eduardo Ferreira Lopes, advogado, foi responsável pela defesa da Conafer por um período, através do escritório “Lopes Advocacia”. O relator questionou se os serviços foram superiores a R$ 5 milhões, mas o depoente não soube precisar o valor.
Cícero Marcelino: Apresentado por Lopes como fornecedor de bens e serviços à Conafer por mais de 15 anos, Cícero Marcelino é apontado pelo relator como sócio de Carlos Roberto na TB Holding Financeira (com 90% de participação de Lopes). Cícero também é proprietário da Santos Agroindustria Atacadista e Varejista, que recebeu R$ 100 milhões da Conafer, e da Nobre Serviços de Eventos, que recebeu cerca de R$ 28 milhões.
Lopes afirmou desconhecer a propriedade da Santos por Cícero e não soube descrever os serviços específicos, mencionando apenas “locações de veículos, compra de sêmen, insumos para melhoramento genético, brinquedos”.
Vinícius Ramos: Cunhado de Carlos Roberto (irmão de sua esposa Bruna), Vinícius Ramos é o Presidente do Instituto Terra e Trabalho (ITT), descrito como “braço de execução” da Conafer e outros atores. A esposa de Vinícius, Thamires Maia de Oliveira, é funcionária contábil da Tesouraria da Conafer.
Lagoa Alta: Empresa administrada pela esposa de Carlos Roberto, Bruna Braz de Souza Santos, que seria veterinária chefe. O Relator indagou sobre uma procuração de Bruna para Cícero Marcelino e sobre suposta participação dela em um processo de licitação fraudado envolvendo emenda parlamentar, fatos negados por Lopes.
Gaspar confrontou Carlos Roberto com informações de que a Conafer seria responsável pela “ressurreição” de centenas de indivíduos falecidos e a inclusão de menores de idade como associados para fins de desconto associativo.
“A Dona Maria Rodrigues já tinha morrido há cinco anos e fez uma assinatura. Olha, esse padrão se repetiu mais de 300 vezes pela Conafer. O Gilberto morreu há 20 anos, mas assinou. É padrão da Conafer ressuscitar mortos para assinatura de descontos associativos?”, perguntou o relator.
Lopes respondeu que, se mortos estavam recebendo benefícios, a Conafer recebia descontos. Ele também argumentou que a amostragem de 40-50 fichas para uma entidade com 8 milhões de associados não era representativa.
O relator também questionou a movimentação financeira pessoal de Carlos Roberto, apresentando dados da Polícia Federal, CGU e Receita Federal que indicavam uma movimentação de R$ 1,76 milhão em dois meses, com uma renda mensal de R$ 15 mil e patrimônio de R$ 60 mil.
Lopes negou as informações, alegando que sua movimentação nos últimos cinco anos foi de “oitocentos mil e poucos” e que “investigações constroem rumos equivocados”.
Em relação à suspensão dos repasses associativos da Conafer em 2020 devido a uma denúncia de um aposentado de Pernambuco, o relator destacou que, apesar do “lockdown” e da impossibilidade de fornecer 100 fichas para fiscalização (justificada por Lopes pela pandemia), a Conafer conseguiu arrecadar mais de 50 mil novos associados no mesmo período, evidenciando uma contundente contradição.
O relator o citou como um “padrinho político” da Conafer, algo que Lopes não se recordou de ter declarado, afirmando que o deputado federal Euclydes Marcos Pettersen Neto (REPUBLICANOS-MG) é um apoiador do setor em Minas Gerais.
Homenagens e proximidade com INSS: O relator questionou a homenagem de Jobson de Paiva Silveira Sales, diretor de Atendimento do INSS, pela Conafer em um período de suspensão da entidade.
Carlos Roberto afirmou que a homenagem era “automática” e que não tinha conhecimento da atuação de Jobson. Ele também confirmou a visita de André Fidelis, ex-diretor de Benefícios do INSS, à fundação do Terra Bank, uma fintech que pertence ao depoente, em Uberaba (MG).
Aviões: O relator perguntou sobre a aquisição de duas aeronaves (um Beechcraft modelo 58P e um Cessna Aircraft modelo 172 RG) por Silas Vaz, Secretário da Amazônia Legal da Conafer, um “morador da periferia de Brasília”. Gaspar insinuou que Silas Vaz seria um “laranja” e perguntou a Lopes se ele já havia voado nessas aeronaves ou se a aquisição foi “fruto de propina”.
Presentes a ministro: Foi revelado que Carlos Roberto enviou um quadro com um cocar de presente ao ex-ministro José Carlos de Oliveira [foi ministro do Trabalho e Previdência do governo Jair Bolsonaro até 31 de dezembro de 2022.], entregue por Cícero Marcelino, que teria feito uma transação de R$ 4.900 com o assessor do Ministro, José Laudenor, para a compra de um álbum de figurinhas da Copa de 2022.
Carlos Roberto Lopes disse ter ficado sabendo da transação através da CPMI. Ele negou envolvimento em ameaças a funcionários do INSS em 2020, quando o Acordo de Cooperação Técnica da Conafer foi suspenso, afirmando ser “cristão” e não trabalhar com “amordaçamentos ou coerções”.
A sessão foi interrompida por meia hora, com o relator questionando detalhes das operações da Conafer, enquanto o depoente reiterava que a Conafer é uma entidade de trabalho sério, que busca resultados e contribui para o desenvolvimento do Brasil.
As revelações e as respostas do Presidente da Conafer sinalizam que a CPMI tem um longo caminho a percorrer na elucidação dos fatos e na responsabilização dos envolvidos.
O mistério sobre as manchas nas mãos de Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Conafer, se deve aos “seus costumes”. Ele se diz filho e neto de indígenas. Em eventos, costuma usar cocar e adereços indígenas. Embora não tenha nenhuma relação com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, a APIB, o empresário, segundo indígenas, costuma usar as alianças da Conafer com lideranças para ele mesmo se colocar como uma.
A Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (CONAFER) atua com terras indígenas na Bahia, com os povos Pataxó, Tupinambá, e Pataxó Hã-hã-hãe, entre outros. Na divulgação das organizações a entidade trabalha prestando apoio por meio de programas como o Mais Parente nas Aldeias, que fomenta a agricultura sustentável, e ações de resgate cultural e de fortalecimento de comunidades. Mas existem comentarios de que a entidade está por traz das invasões de terras que vem ocorrendo nesta região da Bahia.