O ataque de um homem em situação de rua que foi incendiado por um adolescente, no Rio, foi transmitido ao vivo para 225 pessoas num servidor do Discord. A informação é do delegado Cristiano Maia, em entrevista à CBN. Segundo Maia, responsável pela investigação do caso, os espectadores podem responder por apologia ao nazismo, associação criminosa e incitação ao crime.
O episódio aconteceu entre a noite de terça (18) e a madrugada desta quarta-feira (19). Ludierley Satyro José, de 46 anos, foi atacado enquanto dormia na calçada e teve queimaduras em quase todo o corpo. Ele continua internado no Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca, também Zona Oeste.
O delegado afirma que a transmissão chocou até os policiais mais experientes. De acordo com Cristiano Maia, fato que chamou atenção é que, enquanto os responsáveis jogavam dois coquetéis molotov no homem que dormia em uma calçada, na Zona Oeste do Rio, os espectadores não se assustaram com a cena, mas reclamavam da qualidade da transmissão.
“Essa transmissão ao vivo foi para 225 participantes. E uma coisa que chamou a atenção da gente acessando esses dados é que alguns desses espectadores, vamos dizer assim, eles inclusive reclamavam, a internet está instável, está bugando, querendo assistir, mas com dificuldade. Isso reflete uma crueldade, uma frieza. A barbárie não impressionava, eles estavam ali justamente para assistir, e em algum momento que a internet estava instável, eles demonstravam insatisfação por isso”, relata.
Nesta sexta-feira (14), um militar do Exército foi preso suspeito de filmar o adolescente atirando coquetéis molotov. Ele foi identificado como o soldado Miguel Felipe dos Santos Guimarães da Silva, de 20 anos. O homem foi preso na descida da Ponte Rio-Niterói, quando entraria na Avenida Brasil.
A Polícia vinha monitorando a localização dele ao longo do dia e efetuou a prisão assim que ele se movimentou. A CBN procurou o Exército, mas não teve retorno até o fechamento da reportagem.
Cristiano Maia explica que o Discord é um aplicativo criado, originalmente, para conversas em jogos eletrônicos. Ele recomenda que os pais estejam atentos ao que os filhos estão consumindo na plataforma.
“O Discord foi criado para fins de gamers, era basicamente o objetivo, e por isso muitos dos integrantes do Discord são adolescentes. Só que com o tempo houve um desvirtuamento no objetivo dessa plataforma, eu não digo toda, claro que não, mas alguns integrantes participam dessa plataforma. Então, eu acho que o primeiro passo é a vigilância dentro de casa. O que ele está fazendo atrás do teclado dele? Às vezes ele está em casa, dentro do lar dele, e assistindo coisas, produzindo coisas, participando de diversos chats, diálogos, acertos a conteúdo, que são extremamente nocivos para esses adolescentes. Então esse é o primeiro passo. E o segundo passo é a contribuição com as autoridades. Isso também é um fator muito importante até para que a gente possa fazer o nosso trabalho, tanto de prevenção quanto de repressão”.
Nesta quinta (20), o adolescente de 17 anos já havia sido apreendido. A família dele procurou a delegacia ao reconhecê-lo nas imagens, que viralizaram nas redes sociais. Uma perícia também identificou o rapaz através da conta de e-mail e da localização do IP do usuário.
Na casa do menino foram encontradas toucas, máscaras e luvas que ele teria usado durante o ataque, além de uma faca. Os agentes também acharam arquivos de abuso sexual infantil no celular dele. O adolescente vai responder por fato análogo a tentativa de homicídio e armazenamento de imagens de abuso sexual infantil.
O Discord tem uma política de tolerância zero para discurso de ódio e violência, que não têm espaço em nossa plataforma nem em qualquer lugar da sociedade. Assim que tomamos conhecimento de conteúdo desse tipo, seja por meio de nossas ferramentas de segurança ou por denúncia de usuários, tomamos as devidas medidas, que podem incluir o banimento de usuários, o encerramento de servidores e, quando apropriado, o acionamento das autoridades locais competentes. Neste caso, o Discord reportou proativamente o incidente às autoridades, baniu as contas envolvidas e encerrou o servidor. Seguimos cooperando com as autoridades na investigação desse caso.
Na terça feira a Polícia Civil apreendeu, em Pelotas, na Região Sul, um adolescente de 17 anos suspeito de integrar um grupo de ódio na internet que incentivou o ataque com coquetéis molotov contra um sem-teto no Rio de Janeiro. A vítima teve 70% do corpo queimado, e o crime foi transmitido pela plataforma Discord para 220 pessoas.
O caso é investigado pela polícia carioca, que cumpriu mandados de apreensão na terça-feira (15), em diferentes Estados.
De acordo com a delegada Lisiane Mattarredona, responsável por cumprir a ordem judicial de apreensão, o adolescente está internado no Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) de Pelotas.
Ele teria alguma participação na tentativa de homicídio desse morador de rua. Ele negou envolvimento durante o depoimento. Apreendemos na casa dele, onde vive com os pais, celular e equipamentos de informática. As provas coletadas devem integrar o inquérito, que é conduzido pela Polícia Civil do Rio de Janeiro — relatou a delegada.